sábado, 10 de dezembro de 2011

Ontem à noite

Precisei falar com você ontem à noite. Precisei olhar para todos os teus dedos e dizer o quanto eu gosto da tua mão pequena, tão bonita e macia como se fosse de mentira. Precisei cair da cama e bater o nariz no criado mudo pra perceber que você não estava ali. Não tinha calor, nem um céu no teto do quarto. Não tinha um buraco negro dentro do guarda roupa e nem o seu cheiro no travesseiro. Não tinha mais nenhum fio dos teus cabelos escuros preso na rede da varanda. E como era bom deitar contigo ali durante a noite, ficar com os dedos perdidos nas madeixas que escorriam da tua cabeça, só pra ver os morcegos comerem as frutas da árvore do vizinho e contar historias sobre a lua e sobre a maldade desse mundo mesmo que não fossem nada bonitas, mas eu sabia que você gostava de coisas verdadeiras.
Sabe que ontem também tentei te ligar, mas fiquei com medo. E você sempre dizia que eu era medroso em relação a tanta coisa. No fundo não é culpa minha; é como se tivesse outro alguém morando na minha cabeça, alguma coisa que me puxa pra dentro de mim mesmo, algum outro eu segurando minha própria garganta, querendo incondicionalmente sufocar. O mesmo eu que não tem medo das coisas ruins, mas que cansou de lutar contra uma tempestade inacabável aqui. Uma tempestade que já me arrastou e vem tirando muito de mim nos últimos anos. Até preferia ter te conhecido em outra época se é que me entende, numa outra vida talvez. Isso só pra não ter essa lembrança me prendendo nesse lugar horrível. Só pra não sustentar esse lixo de esperança por mais tempo.
Não queria que fosse assim, essa merda toda banhada em álcool – minha vida – indo cada vez mais longe, dando tantas voltas pra chegar ao mesmo lugar. Ando agonizando e me arrependendo de coisas que nem mesmo sei. Ando vivendo e morrendo de saudade enquanto meus passos quase já não são mais passos.

6 comentários:

  1. Quando o momento é ruim para nós, não queremos envolver mais alguém, para não ter que fazer esse alguém sofrer conosco. Mas é sempre nessa hora que essa pessoa resolve aparecer.
    Me identifiquei tanto com o texto que parece até que fui eu quem o escreveu. Bonito. :)

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  2. Demasiado humano! Brota sonhos reais em cada verso dito ou coberto pelo mistério do que muito maior ainda há em todo este caminho de (de)sentimentos vividos por ti!

    Excelente sua expressão! Viva, viva (...)

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  3. Eita minino porreta!

    "(...)e contar historias sobre a lua e sobre a maldade desse mundo mesmo que não fossem nada bonitas, mas eu sabia que você gostava de coisas verdadeiras."

    Lindissimo, Guilherme.

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  4. Li dois textos, virei fã. quero voltar. quero mais...
    te salvei nos favoritos. você parece muito com o que eu escrevo, isso normalmente seria uma bosta, parabéns por quebrar a (minha) regra. e obrigada. obrigada por escrever o que eu queria ler hoje.

    ps.: estou indo dormir agora, espero não sonhar com Madalena. espero a coragem pra dizer mais vezes "eu te amo".

    Beijos.

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