sábado, 2 de junho de 2012

Prepare seus ouvidos

eu tentava dormir as 2:30 da manhã
quando meu celular tocou,
consegui alcança-lo
com muito custo

"ela me deixou" disse uma voz
"ela me deixou de novo,
aquela puta"
"foda-se" eu respondi e
desliguei.

virei-me para o outro lado
acomodando a cabeça no travesseiro
tentando fabricar um sonho bom e
o celular tocou novamente -
eu atendi

"não desligue, fale comigo!" era a mesma voz
"ela me deixou, cara"
num suspiro percebi que o dono da voz era Allan,
ele estava bebado demais e soluçava
"olha, todas elas se vão" eu disse

"você está com uma voz péssima, cara,
o que está fazendo?"
"estou tentando dormir"
"mas não desligue agora, eu vou morrer,
ela entrou no carro de outro e foi embora"
alguma música tocava ao fundo e eu podia ouvir
pessoas conversando.

"escute Allan, você está numa festa, arrume outra garota"
"eu vou morrer" começou a chorar
"compre outra cerveja então"
"oh, boa ideia"
ele desligou.

Allan precisava saber,
não importam as novas manhãs
nem as garrafas,
é adeus o que
mais vamos ouvir
durante toda a
vida

por fim fechei os olhos e dormi -
ao meu lado a velha ausência
que nunca se vai.

9 comentários:

  1. Desfecho sensacional. Gosto dessa forma de expor a realidade crua (ou cruel).

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  2. uma ausência presente. constantemente sinto isso.
    gostei muito do texto, desse jeito sóbrio de escrever.

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  3. deveríamos estar preparados para as ausências e os deixares que acontecem, mas nunca estamos. acabamos imaginando que a solidão é um constante provisório e mal sabemos que o estar junto passa menos tempo em nossos vidas do que a ausência.

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  4. Desfecho sensacional, redundo o comentário. Não é a primeira vez, tens uma capacidade de conduzir a leitura sem que nos apercebamos do fluxo, só acordo quando sinto a pancada do final. Gosto disso, mandaste bem.

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  5. Não é pq o adeus é comum que vamos deixar de senti-lo.

    Mt bom.

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  6. Conheço essas palavras realisticamente amargas.
    Muito bom.

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  7. É nesse constante adeus que eu existo. Tu me encanta moço!

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