domingo, 7 de novembro de 2010

Uma semana sem álcool. As coisas em minha cabeça tornaram-se tão perturbadoras depois daquele episódio que resolvi dar um tempo. Vaguei por ruas e vielas durante dias e noites a fim de tentar arrumar uma forma de pedir desculpas. Por vezes passei em frente a bares; resisti a todos. Comprava cigarro no mercado e me jogava em qualquer banco de qualquer praça. Tentava dormir, tentava pensar e acabava voltando para a casa, passando mais uma vez no mercado. Nos primeiros três dias, sentia que minha cabeça ia explodir, assim como o resto do corpo. Ela não ligaria, eu não saberia o que dizer pra poder ligar. Escrevi uma despedida, uma carta, era disso que precisávamos; quase optei por deixa-la em sua porta e sumir no mundo, ou me matar e acabar de vez com tudo isso, com esses erros estúpidos, com essa rotina idiota. Ainda tenho duvidas se suicídio não seria mesmo a melhor opção. Mais dois dias passaram e me descobri um covarde.
Além de vagar por ai socando árvores e paredes e postes arrumei alguns textos para traduzir, graças ao meu segundo idioma fluente; era uma forma de ganhar algum dinheiro e também de desviar o curso dos meus pensamentos, mesmo sempre fracassando involuntariamente nessa coisa de desviar cursos. No sexto dia, eu tinha 38 textos traduzidos, prontos para serem entregues. Já com o dinheiro no bolso e de volta a casa, me sentei no sofá, acendi um cigarro. O telefone estático ao meu lado, ali, sugando-me a cada segundo era naquele momento um objeto de tortura. Foram precisos mais dois cigarros para encher meu peito de coragem e fumaça. Tirei do gancho o aparelho, decidido a telefonar. Telefonei. Cada toque me agonizava, eu não sabia ao certo o porque de estar ligando, nem o que diria, e de alguma forma era melhor assim.
- Alô?
Isabela atendeu, sua voz tinha poder pra me curar ou me matar de vez.
- Isabela... - Comecei a falar, sem tempo de concluir.
- Você deve achar que sou palhaça, né?
- Escuta, eu queria...
Ela desligou, pude ouvir o bater do telefone.
Amarrei os sapatos, peguei uma jaqueta e a chave do carro em cima da mesa, lembrei que ele estava sem gasolina há mais ou menos um mês. Esqueci a ideia do carro. Por sorte minhas pernas funcionavam perfeitamente, diferente da minha cabeça. Ela nem morava tão longe, mas chovera a manhã inteira, e eu acabei tropeçando numa parte esburacada da calçada, fui de peito numa possa de agua e barro, levantei rápido com aquela lama toda escorrendo pela roupa. Corri por cerca de meia hora até chegar em frente a casa de Isabela. A rua ja estava escura, um feixe de luz passava pela janela da frente. A casa era simples e bonita, diferente do meu apartamento e também não tinha muro ou portão, apenas um caminho de pedras que passava pelo jardim e levava até a porta principal. Me aproximei e toquei a campainha, ouvi passos pelo assoalho lá dentro. A porta abrira vagarosamente. Ela estava descalça, usava um shorts azul, desses de dormir e uma camiseta branca. Fui recebido por algumas lágrimas e vários socos contra o peito. Logo eles cessaram e ela me abraçou sem importar-se com a sujeira:
- Seu idiota, seu idiota - dizia
- Isa, desculpa
- Seu idiota - continuou a dizer.
Pedi desculpas mais uma vez, acho que podia contar nos dedos as vezes em que pedi desculpas em toda a minha vida. Ergui seu rosto, dei um beijo na testa depois outro, explorando seus lábios. Naquela noite tomamos banho juntos e também dormi por lá. Nunca antes havia deitado ali, naquela cama; isso deixou as coisas com outro gosto, não sei ao certo explicar. Havia amanhecido e seguíamos deitados, eu olhava para o teto, dessa vez livre daqueles pensamentos dolorosos; Isabela rolou novamente para cima de mim. Estava sorrindo, mal sabia ela o quanto eu precisava daquele sorriso:
- Somos loucos, não somos? - perguntou ela
Eu franzi as sombrancelhas e a abracei.
- Bom, acho bem provável...
- Melhor assim - ela riu.
Beijou meu rosto por inteiro varias vezes e dormimos novamente; da forma em que eu desejava dormir para sempre. Corpos nus. Corpos entrelaçados.

5 comentários:

  1. sublime, rapaz. sublime.
    já falei isso e não me canso de repetir aqui: me identifico com teus textos. parece que eles são escritos baseados também na minha vida.

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  2. suas palavras me tocam febrilmente,como a qualquer um, espero.

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  3. Escreve maravilhosamente bem, parabéns.

    Tenho um desafio para você, se quiser participar esteja à vontade, http://fragmentadocoracao.blogspot.com/ .

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  4. É essa sutileza de detalhes que enriquece e desvenda cada trecho deixando uma vontade de ler mais, de saber mais.... e que me encanta! Adorei.

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